A DISCREPÂNCIA ESQUELÉTICA
Depois de sentir muitas contraturas musculares, inexplicáveis dores nas costas, na coluna, na região dos quadris, e de fazer de tudo ao meu alcance para evitar ir a médicos como alongamentos, abdominais e natação, imaginei que poderia ter alguma discrepância óssea nos membros inferiores.
Devia ter alguma discrepância esquelética entre os hemisférios: - esquerdo-direito e essa discrepância certamente é que causava a contratura muscular.
Fui atrás de um médico ortopedista. Atrás de um exame que pudesse verificar se havia alguma diferença entre os tamanhos dos meus ossos dos membros inferiores.
Prossegui medindo tudo em mim mesmo. Passei a comparar as dobras de ambos os braços era evidente. O braço direito era maior.
Resolvi fazer uma consulta e pedir a um médico ortopedista famoso de Brasília que solicitasse para uma escanometria. Um exame radiológico que determina a eventual existência de discrepância esquelética nos membros inferiores. Sala de espera lotada, todos esperando pacientemente o atendimento, todos com uma pancada de exames de Raio X embaixo do braço, como em qualquer consultório ortopédico...
O médico foi tocando a anamnese, rindo muito da minha trajetória anterior até seu consultório. que passou por inusitadas Examinou-me, fez os testes de rotina para excluir eventuais hérnias de discos.
Pedi que solicitasse uma escanometria. Só para tirar minhas dúvidas. Ele tentou desconversar, mas, acabou concordando e pedindo o exame.
A ESCANOMETRIA
O diagnóstico do meu exame de Escanometria foi uma discrepância de 0,56 cm ou 5,6 mm perna direita menor.
AS PALMILHAS
Palmilha! Foi a primeira coisa que me veio à cabeça quando peguei o resultado do exame para mostrar ao ortopedista.
No retorno, novamente tive que induzir o médico a receitar uma palmilha corretiva, a despeito de o doutor ter afirmado que tal discrepância era mínima, "todo mundo tem alguma diferença, isso é normal, disse" e continuou, "...na literatura médica não se recomenda correção para tão pouca diferença"...
Mas, no final das contas, receitou uma palmilha para o pé direito: - 0,56 cm conforme o resultado da Escanometria.
O médico me indicou um sapateiro que já havia trabalhado no Hospital da Rede SARAH, em Brasília, assessorando a equipe liderada pelo Dr. Campos da Paz na execução dos projetos de próteses, palmilhas e todo o aparato corretor em pacientes de todos os tipos.
Fui ao sapateiro que fez preliminarmente um molde em gesso do meu pé e fez uma palmilha em couro cru que, de certa forma, aliviou as dores "mudando" alguma coisa. No início fiquei muito animado.
Eu mantinha a MESMA palmilha enquanto permutava os diversos calçados que normalmente usava: - sapatos e tênis. Só não podia usar a palmilha nos chinelos. Observei, porém, que a palmilha estava acentuando cada vez mais a curvatura no meu pé direito. Na verdade, estava deformando meu pé. Afinal, eu não tinha pé-chato. Não precisava da curvatura DEFINIDA pelo sapateiro. O que eu tinha era discrepância óssea!
Percebi que, com o tempo, as dores apenas mudaram de "tipo" e persistiam e a curvatura do meu aumentou já que a palmilha era inteira, indo do calcanhar à ponta do pé.
Após ter mandado fazer a terceira palmilha adquiri um paquímetro profissional, pois, no "olhômetro" desconfiava que a cada palmilha que o sapateiro fazia podia-se observar evidências de que as medidas das alturas das mesmas eram substancialmente diferentes.
Ao medir as três palmilhas constatei que, de fato, o sapateiro não se preocupava com as alturas das mesmas. Todas tinham alturas diferentes, diferenças essas que foram consideradas "irrelevantes" também pelo próprio sapateiro...
Parei de usar a palmilha. Detonei as três. No meu entendimento eu tinha que corrigir APENAS a discrepância e para isso bastaria compensar a altura no calcanhar, apenas.
Tomei uma decisão. Rejeitar terceirizar o meu problema. A partir de então, decidi, eu mesmo cuidaria de tudo. Inclusive de fazer palmilhas que eu precisasse.
Dei de presente, ao sapateiro o paquímetro profissional que havia comprado junto com o conselho para que ele JAMAIS dissesse a seus clientes que diferenças de medidas de suas próteses eram irrelevantes...
Comprei um paquímetro digital com nível de precisão de centésimos de milímetros e passei a fazer as minhas próprias palmilhas.
Tentei fazer, junto com um torneiro mecânico, uma fôrma para passar a "fundir" minhas palmilhas. Usei alguns tipos de resinas e até fibra de vidro, uma tentativa de poder "clonar" palmilhas, sem erros de medidas.
Não funcionou.
Pelo menos, com o nível de precisão que pretendia. Havia sempre necessidade de lixá-las já que a fôrma não garantia a clonagem na acepção da palavra. Dependendo da mistura química das resinas com catalisadores havia formação de bolhas e cada palmilha saia com alturas diferentes.
Comecei a compreender a dificuldade que é de obter-se medida exatas para duas ou mais fôrmas distintas. E essa minha experiência foi fundamental para as conclusões a que cheguei e que estão demonstradas no final deste estudo preliminar.
Ainda assim, caprichando nas medidas e com alguma habilidade no uso de lixas finas consegui fazer palmilhas mais precisas e obtive substancial melhoria nas dores, porém, permanecia o enigma de que, cada vez que eu trocava de calçado tinha que recomeçar a lixar as palmilhas ou refazê-las mais altas, agora, já não dependia mais da palmilha e sim das discrepâncias dos calçados ou das palmilhas também discrepantes que vêm dentro dos tênis.
Passei a duvidar de qualquer indústria de calçados. Passei a levar o paquímetro e o micrômetro sempre que queria comprar algum calçado. Media tudo antes. Todos, sem exceção apresentavam nítidas discrepâncias que variavam aleatoriamente indo de um, dois milímetros e até três milímetros.
Ora, como a maioria o pé esquerdo era sempre MAIOR significava que, além dos 0,56 cm eu estava acrescendo mais de 50% na altura da correção.
Isso alterava todo o quadro de dores e, sobretudo, anarquizava meu raciocínio e bagunçava a minha pretensão de intervir num mundo que eu desconhecia...
Nessa altura de minhas pesquisas, sendo eu a cobaia, começava a perceber que o meu próprio objetivo já era não era tanto descobrir a causa. Começava a me contentar com momentos em que conseguia a supressão da dor.
A ausência absoluta das dores é uma sensação extasiante! E esse desvio de objetivo estava me corrompendo, pois, já havia experimentado várias vezes, de forma aleatória essa ausência absoluta de dor, algo como voltar a ter 16 anos, estando eu com 64!(*)
(*) Hoje com 72.
Esse dilema entre a possibilidade de "acertar" a medida para remover minhas dores e a necessidade de ter uma valentia masoquista de pesquisador permaneceu muito tempo torturando minha mente...
E a causa da dor estava bem na minha cara, ou melhor, nos pés!... Eram realmente os calçados.
Não me lembro o exato momento desse insight.
O que eu sei é que, depois disso, "baixou" de novo em mim novamente o "espírito de pesquisador". Talvez o mesmo que já estava com o saco cheio da minha corrupção em favor apenas da eliminação das dores...
Enchi-me de coragem e comecei a trocar de calçados, de propósito, com muito mais freqüência. Cheguei a ponto de trocar de tênis e andar 3 quilômetros no parque olhos d'água em Brasília só para "sentir" o efeito da troca. E sentia!
Quando atingia um alto grau de bem estar eu trocava o tênis por outro mantendo a MESMA palmilha. Eis o masoquista de volta! As dores recomeçavam imediatamente. Recomeçavam as dores e outros efeitos/sintomas também como aumento de moscas volantes nos olhos, estalos na lateral da fronte, afora zumbidos na cabeça que aumentavam ou reduziam até cessar. Comecei a anotar tudo.
No parque, às vezes, para "saber" se eu estava "alinhado", andava alguns metros tentando me guiar na linha amarela divisória da pista. Dependendo do meu grau de bem estar conseguia dar 30 e às vezes 50 passos em linha absolutamente reta com os olhos fechados. Outras vezes, quando sentia que havia algum desalinhamento em função do tênis diferente, no oitavo ou décimo passo já estava completamente fora da pista...
Comecei, via engenharia reversa, é certo, tentar compreender esse mundo que os ortopedistas reservam para si. Um mundo fascinante e que tem muito mais de física do que de fisiologia ou outra cadeira qualquer da área médica.
Comecei a anotar tudo numa planilha Excel e estabeleci em percentuais os graus das dores e/ou sintomas os quais eu correlacionava com os centésimos de milímetros das palmilhas que vivia lixando sempre na tentativa de "zerar" dores e demais sintomas. Usei inclusive lixas 1.200, aquelas tão finas que se pode usar nas pinturas novas de veículos. Só para "tirar uma poeirinha" da palmilha. Aquilo, pasmem, alterava e em muito os efeitos/sintomas.
Às vezes eu lixava demais. Sentia a inversão dos efeitos e tinha que refazer a palmilha até chegar na altura da que me proporcionava MENOS dores.
As descobertas (os trabalhos) em geral dependem muito mais de transpiração (sacrifícios) do que de inspiração. O site
Eu buscava a causa. Estava disposto a pagar por isso em troca de descobrir o porquê de tudo aquilo. É claro que começava a me sentir um masoquista... Já imaginou? Ficar curtindo e classificando o tipos de dores, se "progressivas" ou "regressivas"? Pois é. Entrei nessa.
Imaginava inclusive que corria riscos já que minha tese é de que mesmo pequenas discrepâncias tinham efeitos brutais no organismo. Em todo organismo. Fiz um pacto comigo mesmo de ser cobaia. E paguei o preço para descobrir. Tive uma labirintite e uma ruptura de retina. Embora eu tenha uma miopia discreta, menos de 1 grau (+) acredito que a CAUSA foi eu ter extrapolado a medida da altura de uma palmilha que fiz baseada numa segunda escanometria que fiz e cuja a plotagem das medidas saiu errada.
Com isso, optei por fazer a palmilha baseada na diferença apurada naqueles dados plotados em cada um dos ossos (fêmur, tíbia) esquerda e direita. A medida errada, plotada na radiografia, me INDUZIU ao erro subsequente de aumentar em quase o dobro a altura da palmilha corretora. Um desastre!
Falo desse erro de plotagem da clínica radiológica mais abaixo.
Mas voltando às confecções das palmilhas passei a fazer várias palmilhas experimentando vários materiais. Alumínio, acrílico, borrachas rígidas etc. Minhas compras eram sempre antecedidas por medições criteriosas com o paquímetro digital e mesmos os materiais tinham variações de alturas numa MESMA peça. Aquilo começou a me estressar. Percebi que o mundo da metrologia já não me satisfazia mais. Comecei a estudar nanotecnologia, coisa ainda incipiente no Brasil, na época. Fucei em muitos sites de matemática para estudar teoria do erro e comecei a entender o porquê de tanta complacência/tolerância com o que as indústrias classificam de qualidade. Mas afinal, de que qualidade eles falam?